O desembargador Carlos Eduardo Contar, presidente do Tribunal Regional Eleitoral de Mato Grosso do Sul (TRE-MS), negou recurso contra a decisão que livrou a prefeita Adriane Lopes (PP) e sua vice, Camilla Nascimento (PP), da cassação dos mandatos por compra de votos na eleição do ano passado.
Contar negou o encaminhamento dos recursos especiais ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) interpostos pelo Ministério Público Eleitoral e por dois partidos contra a decisão do TRE-MS que preservou o mandato de Adriane e Camilla, mesmo diante do fato de que os próprios magistrados reconheceram que ocorreu a compra de votos.
Da decisão do presidente do TRE-MS cabe recurso ao TSE, já interposto pelo PDT e pelo partido Democracia Cristão (PDC), mas mesmo assim, fica evidente a disposição do desembargador Eduardo Contar de protelar ao máximo o encaminhamento da questão, já que a decisão que salvou os mandatos das duas políticas foi proferida ainda em 27 de maio, portanto, há mais de quatro meses.
O procurador regional eleitoral Luis Gustavo Mantovani, que também entrou com recurso especial ao TSE para reverter a decisão do TRE-MS, pelo menos até o momento ainda não se manifestou sobre a negativa do desembargador Carlos Eduardo Contar.
Histórico
Por 5 votos a 2, o TRE-MS decidiu pela manutenção de Adriane e Camilla à frente da gestão da prefeitura da Capital, mesmo após a maioria dos magistrados ter admitido que ficou provada a compra de votos.
A constatação de que houve captação ilícita de sufrágios foi expressada também pelo juiz eleitoral Ariovaldo Nantes Corrêa na sentença que livrou as duas políticas da cassação em juízo de primeiro grau.
“Em razão da aparente prática do crime de compra de votos, determino que sejam extraídas cópias de peças destes autos (inicial, documentos que acompanham a inicial, termo de assentada da audiência de instrução com os depoimentos das testemunhas e petição do MP em alegações finais) e encaminhadas para a autoridade policial a fim de apuração dos fatos”, escreveu o magistrado ao final de sua sentença.
No TRE-MS, foram favoráveis à cassação os juízes Vitor Luis de Oliveira Guibo e Fernando Nardon Nielsen. Contra a cassação se manifestaram Márcio de Ávila Martins Filho, Sérgio Fernandes Martins, Carlos Eduardo Contar, Alexandre Antunes da Silva e Carlos Alberto Almeida.

Não sabiam de nada
A justificativa utilizada pelos que votaram a favor da prefeita e da vice mesmo diante da constatação de que houve crime eleitoral, foi a de que “nenhuma delas tinha conhecimento ou participou da captação ilícita de sufrágios”, como se essa situação as isentasse de serem enquadradas pela legislação, mesmo porque ambas foram beneficiadas e venceram a eleição.
Crime é crime
Outro argumento pouco convincente e bastante contraditório utilizado por alguns dos magistrados, foi o de que a compra de votos não alterou o resultado da eleição.
Adriane obteve 222.699 votos (51,45%) e Rose Modesto (União) ficou com 210.112 (48,55%), diferença apertada de 12.587 votos.
No entanto, independente da quantidade de votos comprados, fato é que o crime eleitoral foi praticado, comprovado pelas investigações e reconhecido pelos magistrados em seus votos, situação que também reforça a possibilidade de Adriane e Camilla sofrerem revés no TSE.
Mesmo impossibilitado de analisar provas, com certeza o fato de que os integrantes do TRE-MS reconheceram a prática de crime eleitoral que beneficiaram a chapa de Adriane e Camilla, seria condição mais do que suficiente para chamar a atenção e levar os juízes do TSE a se debruçarem com maior atenção sobre o caso.

Negativa de Carlos Contar
“A recorrente trouxe como acórdãos paradigmas, precedentes do TRE/PR, do TRE/AP e do TSE, tendo realizado o devido cotejo analítico destes com a decisão recorrida quanto às matérias sobre ‘adesivaços’, reuniões de cunho eleitoral e exploração de assistencialismo em contextos nos quais restaram comprovadas as compras de votos, bem como sobre a interpretação da gravidade e da ciência/anuência dos candidatos beneficiados”, escreveu o desembargador Eduardo Contar ao negar seguimento ao recurso especial.
E arrematou: “No entanto, a douta recorrente não logrou êxito em demonstrar a similitude fática entre as decisões consideradas divergentes, o que inviabiliza o conhecimento do seu recurso pelo Tribunal Superior Eleitoral”.
Provas cabais
Num vídeo anexado aos autos, é possível ouvir claramente reclamações sobre a retenção de documentos e títulos de eleitores por dois cabos eleitorais da prefeita, um sendo identificado por “Kalica”/“Gonçalves” (“o que é calvo”, segundo Edivania Souza do Nascimento, sua prima) e “André”.
No vídeo existem menções diretas à compra de votos que ali aconteceu, tais como “Eu não voto! Se eu não receber, eu não vou votar”, ao que é respondido por “André”: “Mas eu estou falando que você vai receber. É amanhã…”.
O diálogo segue da seguinte forma, pela interlocutora: “Não! Não falou que ia pagar primeiro? Amanhã, quando ela ganhar, ela nem vai olhar na nossa cara. Se liga! Conheço. Nem a pau, Juvenal!”.
Além disso, diversos comprovantes de transferência de valores via PIX a eleitores foram anexados ao processo.