Pela primeira vez em 19 anos, a direita aparece à frente nas pesquisas de intenção de voto para as eleições presidenciais da Bolívia, marcadas para o dia 17 de agosto. O país também escolherá vice-presidente, 130 deputados e 36 senadores.
Com a esquerda dividida, o empresário Samuel Medina (Alianza Unidad) lidera os levantamentos, enquanto Jorge “Tuto” Quiroga (Alianza Libertad Y Democracia) ocupa a segunda posição. Segundo pesquisa divulgada no último domingo (3) pelo jornal El Deber, juntos os dois somam cerca de 47% das intenções de voto.
Do outro lado, antigos aliados do ex-presidente Evo Morales enfrentam dificuldades para consolidar candidaturas. Andrónico Rodríguez, atual presidente do Senado e ex-líder cocaleiro, caiu para cerca de 6% das intenções de voto após deixar o MAS (Movimento ao Socialismo) e se candidatar pela Alianza Popular. Já Eduardo De Castillo, indicado pelo presidente Luis Arce, tem apenas 2%, segundo pesquisas recentes.
Morales, impedido de concorrer por já ter cumprido três mandatos, tem feito campanha pelo voto nulo, aprofundando o racha interno no MAS. Em meio a essa disputa, o presidente Arce também abriu mão da reeleição.
Risco de colapso no MAS
Fundado por Morales e no poder desde 2006 — com exceção do governo interino de Jeanine Áñez (2019-2020) — o MAS vive sua pior crise. Segundo o sociólogo Clayton Mendonça Cunha Filho, da Universidade Federal do Ceará (UFC), o personalismo de Morales implodiu a legenda.
“Na ambição de ser o candidato eterno, Evo Morales fragmentou a frente ampla do MAS, composta por sindicatos, indígenas e tendências marxistas”, afirmou à Agência Brasil.
O risco é que o partido não atinja a cláusula de barreira de 3% dos votos válidos, o que comprometeria sua representação no Parlamento.
Direita se fortalece
Samuel Medina, principal nome da direita, é um megaempresário boliviano que já disputou a presidência em 2014. Foi ministro nos anos 1990 e é associado à política de privatizações. Já Quiroga tem longa trajetória política e chegou à presidência entre 2001 e 2002.
O sistema eleitoral boliviano exige que o vencedor tenha 50% dos votos mais um, ou 40% com vantagem de 10 pontos sobre o segundo colocado. Caso contrário, o país pode ter, pela primeira vez, um segundo turno presidencial, marcado para 19 de outubro.
Teste para o Estado Plurinacional
A eleição de um governo de direita representa o primeiro grande teste para o modelo de Estado Plurinacional, instituído pela Constituição de 2009 sob o governo de Evo Morales. O modelo reconhece a diversidade étnica do país e promoveu avanços em políticas para povos indígenas.
Apesar do avanço conservador, o professor Clayton Cunha avalia que a atual fragmentação partidária deve impedir mudanças estruturais na Constituição.
“Será a primeira vez que um presidente eleito sob esse novo modelo institucional não terá participado de sua construção. Isso pode, inclusive, consolidar a separação entre projeto de governo e modelo de Estado”, avaliou o especialista.
Com cerca de 12 milhões de habitantes, a Bolívia faz fronteira com quatro estados brasileiros: Acre, Rondônia, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul.