Uma linha de fogo com aproximadamente cinco quilômetros de extensão foi detectada na noite de terça-feira (29) em uma área boliviana próxima à fronteira com o Brasil, nas imediações da Serra do Amolar e da Lagoa Mandioré, que ocupa mais de 120 km² entre os dois países. O alerta foi emitido pelo Sistema Pantera, operado pelo Instituto Homem Pantaneiro (IHP), que faz vigilância contínua da região utilizando inteligência artificial.
Com os ventos soprando de leste para oeste a até 25 km/h, o avanço das chamas na direção brasileira foi temporariamente contido, mas o risco de propagação segue em monitoramento. A frente de fogo estava a cerca de 15 km da divisa, o que motivou ações de comunicação emergencial com instituições parceiras na Bolívia e no Brasil, mesmo sem registro de queimadas do lado brasileiro até o fim da tarde de quarta-feira (30).
A situação exigiu resposta rápida da equipe do IHP, que acionou diretamente a Fundación Nativa e a Fundación CERAI, organizações bolivianas com as quais mantém cooperação para prevenção e controle de incêndios. O Instituto também notificou o Prevfogo/Ibama, buscando reforço preventivo diante da possibilidade de avanço do fogo em território nacional.

De acordo com Angelo Rabelo, presidente do IHP, a atuação coordenada entre os países é essencial para preservar comunidades locais e a biodiversidade do Pantanal. “O fogo não reconhece fronteiras. A cooperação transfronteiriça é fundamental para uma resposta eficaz”, afirmou. Ele lembra que, embora as autoridades não possam atuar fora de seus territórios, o intercâmbio de informações e estratégias permite intervenções mais eficientes.
As ações atuais se apoiam em acordos anteriores: em 2024, foi firmado um termo de parceria entre o IHP e a CERAI para ações conjuntas na região da Área Natural de Manejo Integrado San Matías, vizinha à fronteira brasileira, entre o cerrado, as savanas e o bosque seco chiquitano. Neste ano, a articulação foi reforçada com encontros entre representantes do IHP e da Nativa, além da participação da Brigada Alto Pantanal em treinamentos para formação de brigadistas, realizados em Santiago de Chiquitos.
Apesar da estiagem intensa, os dados mais recentes do Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais (LASA/UFRJ) apontam uma área queimada de 14,7 mil hectares no Pantanal entre janeiro e julho deste ano — número bem inferior ao registrado em 2024, quando a região viveu a pior seca em mais de um século e enfrentou grandes incêndios tanto no Brasil quanto na Bolívia.
No lado boliviano, o impacto das queimadas foi devastador. O Departamento de Santa Cruz registrou 6,9 milhões de hectares destruídos pelo fogo, representando 68% da área total atingida no país em 2024. O Departamento de Beni somou mais 2,9 milhões de hectares, ou 29% do total nacional, configurando o maior desastre ambiental já enfrentado pela Bolívia.
O Sistema Pantera, criado pela startup Um Grau e Meio em parceria com o IHP e apoiado pelo projeto Abrace o Pantanal (JBS), tem se mostrado uma ferramenta decisiva na resposta rápida aos focos de calor. Com sensores que identificam fumaça em tempo real e alertam em até cinco minutos — muito mais ágil do que os satélites, que podem levar até oito horas —, a tecnologia já está integrada ao trabalho de órgãos como o Corpo de Bombeiros de Mato Grosso do Sul, Ministério Público Estadual e instituições bolivianas.