O presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou nesta quarta-feira (31) a Política Nacional de Manejo Integrado do Fogo, que traz uma abordagem planejada e coordenada para usar o fogo de forma controlada, visando prevenir e combater incêndios florestais, conservar ecossistemas e respeitar práticas tradicionais. O texto impõe medidas para disciplinar o uso do fogo no meio rural, principalmente entre as comunidades tradicionais e indígenas, e prevê a sua substituição gradual por outras técnicas.
O ato ocorreu durante a visita de Lula a Corumbá, no Mato Grosso do Sul. De 1º de janeiro a 28 de julho, o município concentrou 67,3% dos 4.553 focos de calor no Pantanal, que enfrenta a seca mais grave em 70 anos, intensificada pela mudança do clima. O presidente sobrevoou áreas queimadas e conversou com brigadistas que atuam no combate às chamas.
Lula disse que a lei será um marco no combate a incêndios no Brasil e destacou a importância do trabalho conjunto entre governo federal, estaduais e municipais. Ele também falou sobre a importância do Pantanal para o Brasil. “Um país que tem um território como o Pantanal e a gente não cuida disso, esse país não merece o Pantanal. O Pantanal é um patrimônio da humanidade, pela diversidade de coisas que tem aqui”, disse.
Vestido com roupas de brigadistas, Lula contou que ficou emocionado vendo os profissionais tentando apagar o fogo. “Muitas vezes, do nosso gabinete em Brasília, a gente não tem noção do que é um brigadista. E eu tive o prazer hoje de ver um brigadista de carne e osso, um cidadão igual a mim, que tem a missão nobre de apagar o fogo que a natureza trouxe ou que algum inimigo trouxe”, disse o presidente.
Até 29 de julho, foram registrados 82 incêndios no Pantanal; 45 foram extintos e 37 estão ativos, dos quais 20 controlados (quando o fogo está cercado por uma linha de controle). Em apoio às equipes locais, o governo federal tem 890 profissionais em campo, entre integrantes das Forças Armadas, do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), da Força Nacional de Segurança Pública e da Polícia Federal. São 15 aeronaves em operação, entre aviões e helicópteros, e 33 embarcações.
A ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, fez um apelo para que o fogo não seja provocado na região. “Se não parar de colocar fogo, não tem quantidade de pessoas e equipamento que vença. O que pode fazer a diferença é parar de atear fogo no Pantanal”, disse.
Usos do fogo
Aprovada pelo Congresso Nacional, a nova política nacional proíbe a prática de colocar fogo como método de supressão de vegetação nativa para uso alternativo do solo, exceto quando há queima controlada dos resíduos de vegetação. Para práticas agropecuárias, o uso do fogo será permitido apenas em situações específicas, de acordo com as peculiaridades das localidades.
Também será permitido utilizar o recurso nos seguintes casos: pesquisa científica aprovada por instituição reconhecida; prática de prevenção e combate a incêndios; cultura de subsistência de povos indígenas, comunidades quilombolas ou tradicionais e agricultores familiares; e capacitação de brigadistas florestais.
O texto define os tipos de queimada como controlada e prescrita. A primeira é a usada para fins agropecuários em áreas determinadas e deverá constar em plano de manejo integrado do fogo, com autorização prévia dos órgãos competentes. A autorização poderá ser dispensada para fins de capacitação em manejo integrado do fogo, desde que a área queimada não ultrapasse 10 hectares e esteja de acordo com as diretrizes do Comitê Nacional de Manejo, que ainda será criado.
Já a queimada prescrita ocorre com planejamento e controle do fogo para fins de conservação, pesquisa ou manejo dentro do plano integrado. É o que ocorre, por exemplo, no controle de espécies exóticas ou invasoras. Essa modalidade também exige autorização prévia.
No caso de práticas agropecuárias, o texto prevê ainda a possibilidade de que o órgão competente estabeleça critérios para concessão de autorização por adesão e compromisso, que também deverá seguir todos os requisitos ambientais e de segurança, estabelecidos na política. Além disso, os proprietários de áreas contíguas poderão fazer manejo do fogo de forma solidária, em que ambos respondem pela operação, caso o local tenha até 500 hectares.
A autorização dessas queimas poderá ser suspensa ou cancelada pelo órgão competente em algumas situações, como no caso de risco de morte, danos ambientais ou condições meteorológicas desfavoráveis ou descumprimento da lei.
Áreas protegidas
Se a queimada for para agricultura de subsistência exercida por povos indígenas, povos quilombolas e comunidades tradicionais, conforme seus costumes e tradições, o projeto não exige autorização. Ainda assim, haverá exigências, como acordo prévio com a comunidade residente e comunicação aos brigadistas florestais responsáveis pela área, além de ocorrer apenas em épocas apropriadas.
A implementação da política de manejo integrado nas terras dessas populações deverá ser feita pelo Ibama, em parceria com a Funai, Fundação Cultural Palmares, Incra e Secretaria de Coordenação e Governança do Patrimônio da União.
Quando o órgão ambiental autorizar a queima controlada em áreas limítrofes a terras indígenas ou territórios quilombolas e nas zonas de amortecimento de Unidades de Conservação (UCs), ele deverá informar aos órgãos gestores respectivos. Se houver sobreposição de Terras Indígenas, territórios quilombolas e UCs, o manejo integrado do fogo deverá ser planejado para compatibilizar os objetivos, a natureza e a finalidade de cada área protegida.
O texto também cria instâncias intergovernamentais para gerenciar respostas a incêndios nas vegetações. Brigadas voluntárias e particulares deverão se cadastrar junto ao Corpo de Bombeiros do estado em que atuarão. Caberá ao Ministério do Meio Ambiente a organização de um cadastro nacional de brigadas florestais.
Nas situações em que os bombeiros militares atuem em conjunto com brigadas florestais, a coordenação e a direção das ações caberão à corporação militar, exceto se as operações ocorrerem em terras indígenas, quilombolas e outras áreas sob gestão federal.