Mensagens em celulares apreendidos comprovam troca de favores por voto em Corumbá

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  • Post publicado:18 de novembro de 2021

Corumbá (MS)- A quebra do sigilo telefônico do aparelho apreendido em posse de um servidor público de Corumbá, durante ação da Polícia Federal, em novembro de 2020, revelou um suposto esquema organizado para compra de votos que teria sido implementado com recursos públicos nas eleições municipais no mesmo ano.

A reportagem do Folha MS apurou que mensagens trocadas entre servidores comissionados nomeados pelo atual gestor municipal, apontam a compra de votos realizada por meio de pagamento em dinheiro, troca por cerveja, tijolos, materiais de construção e até marmitex.

Os dados foram apontados nas investigações da Polícia Federal que motivaram a realização da Operação Mercês, que no dia 19 de outubro de 2021, cumpriu quatro mandados de busca e apreensão expedidos pela Justiça Eleitoral, em desfavor dos suspeitos de integrarem e movimentarem o esquema na cidade.

Uma agenda apreendida com um servidor comissionado da Prefeitura de Corumbá, quando este deixava o comitê político da campanha do atual prefeito Marcelo Iunes, revelou uma relação de nomes, telefones e diversas “demandas” que seriam concedidas aos eleitores.

material apreendido
Material apreendido com funcionário da prefeitura durante campanha eleitoral revelou esquema com suspeita de compra de votos

Foi através do acesso às conversas mantidas no aplicativo do celular apreendido com o servidor comissionado, que a Polícia Federal descobriu a participação de vereadores e candidatos que eram beneficiados com o esquema de compra de votos.

Todos, fazem parte da chamada “base aliada” do prefeito na Câmara Municipal, e obtiveram êxito com a empreitada nas eleições de 2020.

Voto vale “cinquentão”

Em uma das mensagens, trocadas entre o vereador e o servidor da prefeitura, fica claro o acerto financeiro para compra de votos que segundo o articulador, teria acertado com uma intermediária o pagamento de pelo menos 26 pessoas que teriam os votos comprados a R$ 50,00 (Cinquenta reais) cada.

Além do valor explicito nas conversas, o servidor cobra o parlamentar que tentava a reeleição a entregar o que chamou de “Doce das crianças”. Expressão que acredita-se ser referente a outras negociações financeiras utilizada para compra de votos.

SERVIDOR: “(Vereador), meu nobre, boa noite! Acabei de sair aqui da casa de dona (eleitora), tá?!

Uma pessoa forte nossa aqui que, acabei de falar com ela quantas pessoas que vem da fazenda dela né?! Ela falou que vem em torno de vinte e duas, vinte e seis pessoas pro dia da eleição, mais a vizinhança dela! Aí já expliquei pra ela, falei que, passei uma relação pra ela, ela vai numerar todo esse pessoal aí, cadastrar tudo certinho! Aí no dia, pra esse povo aqui vai ser cinquentão entendeu? Por cabeça! Tranquilo?”

SERVIDOR:Outra coisa, já tão me ligando aqui, perturbando, quando que sai do “doce das crianças?”

VEREADOR: “É… vamos fazer o fecha amanhã depois da reunião lá do taquaral, tá?! Porque aí a gente desce aqui pra Tiradentes, pra resolver todo mundo, tá bom?! Um ‘beijo na bunda’!”

Exames e atendimento médico

Uma das principais “moedas de troca” utilizada para o angariamento de votos, seria o fornecimento de privilégios ao atendimento médico e realização de exames dentro da rede pública de saúde do município.

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Eleitora envia mensagem agradecendo a “ajuda” para realização de exames

A perícia realizada no celular do servidor, encontrou encaminhamentos de pedidos de exames que teriam sido enviados pelo vereador, solicitando favorecimento de pessoas que seriam seus eleitores ao acesso privilegiado e a realização de exames médicos com prioridade.

Uma outra conversa entre o vereador e o servidor da prefeitura, fica clara a concessão de privilégio a determinadas pessoas visando o interesse em angariamento de votos mediante a utilização da estrutura municipal.

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Servidor relata ter conquistado mais votos ao vereador apenas um exame

Cestas básicas e benção do “Chefe maior”

Em outra conversa mantida pelo servidor, os policiais encontraram um áudio com o pedido de dinheiro para confecções de cestas básicas que seriam distribuídas às famílias selecionadas para realização da troca de votos.

Na transcrição inclusive, fica clara a ciência dos fatos pela pessoa que o servidor chamou de “Chefe Maior”. Além de se aproveitarem para oferecer os “benefícios” a pessoas que estariam passando por dificuldades.

“Nobre! Bom dia ou boa tarde, se você já almoçou, né?! Eu tô na estrada, indo pra caça! Meu líder, deixa eu te falar, eu tenho uns pedidos aqui de (eleitor). O Chefe maior já deu pra me atender 25 famílias tá, eu já resolvi. Aí pintou cinco demandas, cinco famílias, tá?! E… vê com você, se você não me ajeita, é coisa mínima, é quarenta conto pra cada um!

Que eu vou fazer uma cesta igual eu fiz pros outros, de… pra distribuir. Entendeu, fica um negocinho bem legal! Aí são cinco famílias, R$40,00, duzentos conto a gente mata isso aí, tá bom?! Ele (Chefe Maior) me deu pra mim atender um povo e já atendi, aí o pessoal sempre deixa pra depois né, me solicitaram agora aqui!

Aí se for me conseguir, você me dá um alô que quero ver se amanhã de manhã já mato isso aí, tá bom?! E aquelas três demandinhas lá, se você conseguir pelo menos uma cara, que é pra mim atender uma lá da cervejaria que é bem humilde, cara, a mulher ligou até chorando e ela teve filho esses dias entendeu, e eu falei que ia ajeitar um ‘negocinho’ pra ela, tá bom?! Vê aí e me dá uma posição!”

Voto barato, seis votos por duas marmitex

As conversas mostraram que a compra de votos através do fornecimento de benefícios, chegou ao ponto de ser efetivada em troca de duas marmitex, destinadas para seis eleitores no bairro Padre Ernesto Sassida.

A conversa se deu entre o servidor que teve o celular apreendido e um outro comissionado da prefeitura que segundo as investigações, estaria à disposição de um candidato a vereador aliado ao prefeito.

No áudio, o servidor chega a debochar do preço pago pelo voto e coloca o próprio eleitor para enviar um áudio cobrando o alimento.

marmitex
Até marmitex era utilizado como moeda de troca por votos

Servidor 1: “Beleza, então! Aí você compra uns dois marmitex a mais e já deixa aqui também, cortesia do (Vereador)

Servidor 1: “Eu já arrumei até um eleitor aqui para (Vereador) aqui viu, por dois

marmitex! Barato hein?! Tomar no cú!”

ELEITOR (Nome desconhecido): “Batata, eu to esperando a marmitex!”

Servidor 1: “Promessa é dívida papai! Se você não trouxer, vai perder os votos da família dele! São seis pessoas lá, te dei de graça, hein?!

Servidor 1: “Eu vou falar pro GORDO que você não pagou o marmitex pro eleitor dele lá, hein?!”

Pagamento “Por fora”

Outra forma ilegal de assegurar apoio político realizado durante a campanha, foi a contratação de pessoas sem a referida prestação de contas à justiça eleitoral, no chamado, “Pagamento por fora”, prática vedada na legislação.

A conversa entre os dois servidores mostra como uma mulher que receberia o benefício do seguro defeso, foi contratada sem que a prestação de contas passasse pelo crivo da justiça eleitoral.

Áudio Servidor 2: “Isso, eu expliquei pra ela né, que ia ver como ia fazer a situação dela, porque o dela não pode cadastrar! Você entendeu, né?! Por causa do negócio dos pescadores lá, senão lá corta o auxílio dela, beleza?! Daí eu expliquei pra ela, daí eu falei pra ela que ia ver como ia ficar a situação dela! Tem que falar com o ‘GORDO

pagar por fora

Logo em seguida o servidor 1 envia a resposta por mensagem confirmando a ordem de que a referida eleitora deveria ser contratada “por fora”.

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