Conhecido por sua versatilidade e pela capacidade de insuflar vida a personagens memoráveis, Paulo José fez história no cinema, no teatro e na televisão brasileira. O ator morreu na noite de ontem, aos 84 anos, no Rio de Janeiro, após ficar internado por 20 dias para tratar uma pneumonia. A família ainda não esclareceu a causa da morte. Desde 1992, Paulo José sofria com a doença de Parkinson.
Longe da TV há sete anos, seu último papel foi na novela Em família, de Manoel Carlos. Na obra, ele interpretou Benjamin, um personagem que, assim como na vida real de Paulo, sofria com o Parkinson, e ia morar com a família depois de anos sem ver o filho Virgílio — papel de Humberto Martins.
Paulo José deixa esposa e quatro filhos: Ana, Bel e Clara Kutner, de seu relacionamento com a atriz Dina Sfat, além de Paulo Henrique Caruso. Ele era o segundo filho de uma família de cinco irmãos do interior do Rio Grande do Sul. Em 2020, três deles morreram de câncer. O ator também foi casado com as atrizes Beth Caruso (1979-1982); Carla Camurati (1983-1986); e Zezé Polessa (1989–1997).
Sempre lembrado por personagens marcantes como o comerciante cigano Jairo em Explode Coração (1995), de Gloria Perez, ou o alcoólatra Orestes de Por amor (1997), de Manoel Carlos, Paulo José também dirigiu e participou da criação de diversas séries durante os mais de 60 anos de carreira.
Do interior para o Brasil
Paulo José Gómez de Souza nasceu em Lavras do Sul (RS), em 20 de março de 1937. Teve seu primeiro contato com o teatro na escola, em Bagé, aos 10 anos de idade. Em 1960, mudou-se com a família para Porto Alegre, prestou vestibular para medicina e, depois, para arquitetura. No entanto, o amor pelo palco falou mais alto e ele começou a carreira no revolucionário Teatro de Arena: lá ele foi ator, contrarregra, assistente de direção, produtor, diretor musical, cenógrafo e figurinista.
A primeira peça em que trabalhou como ator foi Testamento de um cangaceiro, de Chico de Assis, em 1961. Na televisão, estreou na TV Globo em 1969, na novela Véu de noiva, de Janete Clair.
Seu primeiro personagem marcante foi o mecânico-inventor Shazan, que formava uma dupla cômica com Xerife, de Flávio Migliaccio, em O primeiro amor (1972), de Walther Negrão. A dobradinha fez tanto sucesso que virou o seriado Shazan, Xerife e Cia., escrito, dirigido e interpretado por Paulo e Flávio, entre 1972 e 1974.
Atuou em mais de 20 novelas e minisséries. Como diretor na TC, trabalhou em alguns episódios de Casos Especiais na década de 1980, e das minisséries Agosto (1993), adaptação de Jorge Furtado e Giba Assis Brasil do romance de Rubem Fonseca; Memorial de Maria Moura (1994), adaptação de Jorge Furtado e Carlos Gerbase da obra de Rachel de Queiroz; e Incidente em Antares (1994), adaptação de Nelson Nadotti e Charles Peixoto do livro homônimo de Erico Veríssimo. Paulo José também fez parte da equipe que implementou o programa Você decide.
Um ator múltiplo na telona
O padre e a moça (1966)
Paulo desponta no filme de Joaquim Pedro de Andrade. Baseado em poema de Carlos Drummond de Andrade, apresenta Paulo como um religioso que luta para sufocar o desejo vvido pela personagem de Helena Ignez, depois que ele adentra em uma interiorana cidade mineira. Atuação premiada na II Semana do Cinema Brasileiro.
Todas as mulheres do mundo (1967)
Numa ode ao corpo da personagem Leila Diniz, Paulo faz história numa delicadíssima cena do cinema nacional. Em flerte com a persona do diretor (do filme) Domingos Oliveira, dá vida a Paulo, irrefreável conquistador no dilema de, finalmente, sucumbir à monogamia, depois de conhecer a professora Maria Alice.
Macunaíma(1969)
Sob a direção de Joaquim Pedro de Andrade, Paulo José se multiplica na tela. Melhor ator no Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, ele dá vida ao protagonista na deliciosa e ilógica coerência da trama adaptada da literatura de Mário de Andrade. É quase uma súmula do brasileiro, que está a serviço do mais tropicalista filme.
O palhaço (2011)
Dividindo cenas com Selton Mello (também diretor), Paulo José embarca numa comédia agridoce, em que, numa vertente à la Chaplin, serve de inspiração bastante desgastada. Na pele do palhaço Puro Sangue, ele passa pela trama em que o filho (Mello) parece abraçar um ocaso de graça e ânimo.